Começam a aparecer postagens de propaganda
das FESTAS JUNINAS dos municípios do Rio Grande do Norte e isso traz muitas
mensagens sublimares. É sobre isso que ontem eu conversava com uma pessoa que
trabalha com cultura em Natal.
O assunto foi sobre a descaracterização
das festas juninas do Nordeste (Problema sério!). Aqui me atenho ao Rio Grande
do Norte para falar com propriedade. Já ressalvo que não proponho congelar o
passado, engessando-o, tendo em vista que a civilização anda para
frente. Também não estou querendo que as festas sejam festas
catequéticas. Refiro-me a conservar a essência das tradições (como os
gaúchos fazem). Lá eles dizem “Mateus, primeiros os teus”. (Certíssimos!).
Festa Junina é uma tradição muito forte
no Rio Grande do Norte. Ela está na alma do povo potiguar. As coisas juninas
transcendem, estão no ar. As pessoas praticam as festas juninas dentro de casa,
no quintal, na calçada, no bairro, no comércio formal e informal, nos festejos
públicos. É uma fusão de tradições em que encontramos a gastronomia, os
festejos, a linguagem, as bebidas, hábitos, religiosidade, musicalidade, enfim,
uma gama de comportamentos.
Mas mesmo assim não significa que a
tradição mantém viva a sua essência.
Algumas prefeituras norte-rio-grandenses
– totalmente equivocadas – tem a bizarrice de trazer cantores sertanejos para o
São João do Nordeste. O que Gustavo Lima e Luan Santana têm – por exemplo – com
o São João do Rio Grande do Norte? Esses artistas estão para a Festa de Peão de
Boiadeiro, de Barretos, interior de São Paulo, como Elba Ramalho, Alceu
Valença, Zé Ramalho, João Gomes, Jorge de Altinho, Petrúcio Amorim, Flávio
José, Zé Vaqueiro, Dorgival Dantas e uma porção de outros artistas incríveis
estão para o São João do Nordeste. São costumes e tradições muito peculiares a
cada região.
Não é preconceito, bairrismo ou algo do
tipo. É sensatez e preocupação com a valorização das raízes nordestinas. As instituições
públicas que promovem a Cultura (Secretarias, Fundações etc, municipal e
estadual) têm o dever moral de serem as primeiras a preservar a cultura do seu
povo. É papel dos gestores públicos, em especial dos que ocupam pastas da
Cultura, ao invés de usar a máquina pública ao gosto pessoal de meia dúzia de
equivocados.
Alguém já viu Dorgival Dantas, Elba
Ramalho ou João Gomes se apresentando na Festa de Peão de Boiadeiro de
Barretos? Eles já cantaram no Oktober Fest de Santa Catarina ou na Festa da
Uva, no Rio Grande do Sul? (Nunca!). São
festas que refletem a essência deles. Da mesma forma é o São João do Nordeste
que tem tudo a ver com a nata da música nordestina, o zabumba, o pandeiro e a sanfona.
As festas do Nordeste tem lugar para
todos os artistas, ritmos e gostos NO MOMENTO CERTO. Mas há uma exceção quando
falamos de SÃO JOÃO NO NORDESTE. O problema é que as instituições públicas que
promovem a cultura – salvas as raras exceções – precisam ser provocadas a
reverem tal equívoco.
Negar ao povo o fomento às suas tradições
é com toda certeza uma forma de corrupção, pois quando os gestores públicos –
que tem todas as ferramentas possíveis para enaltecer as raízes culturais de um povo – deixam
de fazê-lo, estão corrompendo a sociedade, alienando-a. E nessa alienação, os
eventos públicos arrastam outros problemas. Basta ver os vídeos que têm em abundância na
internet, pós-festas. Creio que pai algum gostaria de saber que sua filha ou o
seu filho se submetem a tanto vexame (drogas, comas alcoólicos, estupros,
brigas, acidentes etc). Isso acontece a partir dos palcos, cujas músicas pregam
todo tipo de vulgaridade. Se é possível fazer diferente, por que não tentar?
É muito injusto ver as nossas crianças
e os nossos jovens perdendo a sua identidade cultural ou entendendo as festas
públicas como espaços de degradação. Esse discurso parece careta, mas não é. A
população deve resistir e reivindicar, afinal os homens que estão no poder,
hoje, foram colocados ali para representar o povo, e se esses homens estão
equivocados, a sociedade deve dizer “Alto lá!”
Não é feio nem careta sentir saudade da
beleza, da poesia, da amorosidade, da presença das famílias, da alegria da
população junta e misturada, da satisfação de estar num evento seguro, desde a
sua estruturação às apresentações artísticas. Pelo contrário: é bonito!
Quando alguns criticam a falta de
poesia na aura cultural, referindo-se às músicas que trazem letras e
coreografias cheias de vulgaridade e futilidades, quando criticam os equívocos
nos festejos públicos, a ausência da qualidade nas letras das músicas, o
desconforto que muitos sentem ao ouvir vulgaridades num espaço onde há
crianças, jovens, adultos e idosos – espaço de sociabilidade que deveria servir
para celebrar as suas tradições genuínas – o que esse povo faz?
Que tal pensar? Pensar e por em prática
ideias e alternativas para que a nordestinidade volte aos bairros, às vilas,
aos lugarejos, às cidades. Que as famílias realmente se sintam bem nos festejos
juninos. Que os artistas da terra sejam valorizados e respeitados nas festas
públicas, que sejam remunerados com justiça, assim como os sertanejos são.
Não sou contra os sertanejos nem a
outros ritmos, inclusive nasci num estado em que as emissoras de rádio tocam
sertanejo o dia inteiro – sou fã de Milionário e José Rico e Tonico e Tinoco e
uma porção de artistas sertanejos (de verdade) –, mas os sertanejos devem ter
lugar em outras festas nordestinas (aniversário da cidade, destas natalinas).
No São João, não! O São João é quando o povo nordestino deve recarregar as suas
baterias culturais – dançando xote, baião, xaxado e todas as vertentes do forró
genuíno do passado e do presente – renovando-as, transmitindo-as às novas
gerações...
Pois é, eis que – na condição de folclorista
– trago esse texto para instigar, ou pelo menos tentar conduzir a sociedade ao pensar!
Luís Carlos Freire – IHGRN.
Falou tudo! Parabéns 👏
ResponderExcluir